quarta-feira, 4 de março de 2009

Revolta; Indignação; Repulsa; Nojo

São esses sentimentos que remoeram o meu ser quando assisti ao jornal Hoje, da rede Globo, no dia 4 de março de 2009.

Notícia (negrito)
Comentário (normal)


Igreja Católica é contra o aborto de menina de 9 anos estuprada pelo padrasto, grávida de gêmeos.

A Igreja Católica tentou impedir o aborto e ameaçou ir à Justiça (debilmente, já que o aborto no Brasil é permitido em caso de estupro ou quando o feto representa um perigo para a sobrevivência da mulher (Art. 128 - Código Penal Brasileiro), lamentando que o procedimento tenha sido realizado.

O advogado da Arquidiocese de Olinda e Recife, Márcio Miranda, deve apresentar ao Ministério Público de Pernambuco, até a próxima sexta-feira (dia 6), denúncia de homicídio contra a mãe da menina de 9 anos que estava grávida de gêmeos. Segundo Miranda, a mãe da menina deve ser penalizada por ter consentido com a prática do abordo dos fetos, realizada na manhã desta quarta-feira (dia 4) em um hospital do Recife.

1ª grande desinformação da Igreja Católica, desconhecer as leis brasileiras. A Igreja Católica tem o direito constitucional de expressar sua posição sobre o tema, mas provavelmente não ganhará judicialmente essa causa, uma vez que viola a lei brasileira e a lógica (ainda que invoque o princípio da dignidade da pessoa humana).

Afirma o arcebispo de Olinda e Recife, Dom José Cardoso Sobrinho: "Nós, ministros da Igreja Católica, temos obrigação de proclamar as leis de Deus. Nesses casos, os fins não justificam os meios e a lei humana contraria a lei de Deus, que é contra a morte".

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) divulgou nota em que destaca o mandamento "não matarás" e reforça as críticas feitas ao aborto.

Segundo reportagem do jornal O Globo, o diretor médico responsável pelo procedimento, dr . Sérgio Cabral: "O risco maior seria dela continuar essa gravidez. Uma criança de 9 anos não tem ainda seus órgãos formados".

De acordo com a diretora do Cisam, a criança poderia sofrer ruptura de útero, hemorragia e bebês prematuros, além de risco de diabete, hipertensão, eclâmpsia e de se tornar estéril. A mãe da menina também foi excomungada. As informações são do jornal "O Estado de S.Paulo".

Não defenderia esse ponto de vista nem se fosse o católico mais fanático do mundo. Por um simples motivo lógico: ao proclamar que o aborto, nesse caso, é contra as leis de Deus, o arcebisto está sendo um grande hipócrita, pois desconsidera a provável morte da menina durante o nascimento do filho. Ponderando o caso concreto e considerando a lei em vigor, o aborto seria a decisão mais humana a ser tomada. Palmas para o médico que não teve medo de prosseguir a operação.

Se vamos proclamar as leis de Deus, então por quê não defender a escravidão (Levítico 25, 44-46), a possibilidade jurídica de vender sua filha como escrava sexual (Êxodo, 7-11), surra de vara nos filhos desobedientes (Provérbios 13, 24; 20, 30; e 23, 13-14), a morte aos filhos rebeldes (Êxodo 21, 15; Levítico 20,9; Deuteronômio 21, 18-21, Marcos 7, 9-13; Mateus 15, 4-7), o apedrejamento de pessoas até a morte por heresia, adultério, homossexualismo, por trabalhar no sábado, adorar imagens e praticar "feitiçaria"? Por quê? POR QUÊ? ²

Detalhes importantes: a única restrição da Bíblia em que Deus aconselha acerca de escravidão é que não devemos bater nos nossos escravos tão severamente a ponto de ferir seus olhos ou seus dentes (Êxodo 21, 26-27). É importante também considerar que em nenhum ponto do Novo Testamento Jesus faz objeção à prática da escravidão. São Paulo até exorta os escravos a servirem bem aos seus senhores - especialmente bem aos senhores cristãos (Efésios 6, 5-7; I Timóteo 6, 1-4).

E continua: "A menina engravidou de maneira totalmente injusta, mas devemos salvar vidas. A Igreja sempre condenou e vai continuar condenando o aborto".

"A Igreja (Católica) sempre defendeu a vida e tem que seguir fazendo isso sem se adaptar às correntes da época ou à oportunidade política", diz o cardeal Battista Re ao jornal italiano.

O que eles estudam em Teologia? Será que esses teólogos não têm aulas de História ou preferem ignorar o que não lhes beneficia? A Igreja Católica mudou de opinião sobre o aborto ao menos 3 vezes! São Tomás de Aquino e Santo Agostinho, os principais teóricos do cristianismo, defendiam o aborto até o 40º dia de gestação (idéia original de Aristóteles)!³

Essa foi a posição oficial da Igreja até 1588, quando o papa Sixto 5º condenou a interrupção da gravidez, sob pena de excomunhão. O engraçado é que o sucessor de Sixto 5º, Gregório 9º, voltou atrás e determinou que o embrião não formado não poderia ser considerado ser humano e, portanto, abortar era diferente de cometer um homicídio.

Essa visão perduraria até 1869, no papado de Pio 9º, quando a Igreja novamente mudou de posição, considerando que os cientistas da época não haviam chegado a um consenso de quando começava a vida, Pio 9º decidiu que o correto seria não correr riscos e proteger o ser humano a partir da hipótese mais precoce, ou seja, a da concepção na união do óvulo com o espermatozóide.

A opinião atual do Vaticano sobre o aborto, no entanto, só seria consolidada com a decisão de teólogos de que o primeiro instante da vida ocorre no momento da concepção, e que, portanto, o zigoto deveria ser considerado um ser humano independente de seus pais.

Outro fato importante: repararam que até agora não foi citada a Bíblia? Por um simples motivo: a bíblia não fala uma linha sobre o aborto! A visão católica do aborto foi acordada por teólogos, e não pela Bíblia!

O arcebispo de Olinda e Recife excomungou nesta quarta-feira, dia 4, a mãe, os médicos e outros envolvidos no aborto sofrido por uma menina de 9 anos.

“Para incorrer nessa penalidade eclesiástica, é preciso maioridade. A Igreja, então, é muito benévola, quer dizer, sobretudo, com os menores. Agora os adultos, quem aprovou, quem realizou esse abordo, incorreu na excomunhão. A Igreja não costuma comunicar isso. Agora, a gente espera que essa pessoa, em momentos de reflexão, não espere a hora da morte para se arrepender”.

Nesta sexta-feira (dia 6), o arcebispo disse que o padrasto, suspeito de violentar a menina e ser pai dos bebês, não pode ser excomungado. "Ele cometeu um crime enorme, mas não está incluído na excomunhão", afirmou Sobrinho. "Esse padrasto cometeu um pecado gravíssimo. Agora, mais grave do que isso, sabe o que é? O aborto, eliminar uma vida inocente."

Será que eu li direito? Vamos reler os fatos:

1 - A mãe da menina, o médico que praticou o aborto legal e todos os outros envolvidos no ato foram excomungados.

2 - O estuprador da menina (que também provavelmente estuprava a irmã desta) não foi excomungado.

3 - A Igreja pensa que o aborto é pior que o estupro.

Para refletir:

a) Se eliminar uma vida inocente é pior que o estupro, por quê então a Igreja não inclui no seu "rol da excomunhão" o infanticídio? o homicídio? o latrocínio? o genocídio? Afinal, essas não podem também ser pessoas inocentes que perderam suas vidas? Então qual a diferença entre alguém inocente morto em um genocídio e em um aborto? Se não há diferença, por quê o Papa João Paulo II não incluiu esses crimes no novo rol?

b) Será mesmo que o aborto é mais grave que o estupro? O cardeal alega que o aborto elimina uma vida inocente. E o estupro? Será que a vida de algumas mulheres que são estupradas não fica permenentemente abalada? Será que não se mantém nelas marcas físicas e psicológicas constantes? Não se trata de uma vida inocente que será abalada por toda sua existência?

A primeira coisa que pensei quando li esta notícia foi buscar quais crimes acarretam na excomunhão. Eis que esperava encontrar crimes bárbaros, como o genocídio, a tortura, a escravidão, mas levei um choque. Quais crimes poderiam ser mais graves que o aborto? Vejam com seus próprios olhos:

O Código de Direito Canônico prevê, desde 1983, nove casos para a pena de excomunhão (ver código):

  1. Profanação das espécies sagradas
  2. Violência física contra o Pontífice
  3. Absolvição por um sacerdote do cúmplice do pecado da carne
  4. Consagração ilícita de um bispo sem mandato pontifical
  5. Violação direta do segredo da Confissão
  6. Apostasia
  7. Heresia
  8. Cisma
  9. Aborto
Não é necessária uma longa reflexão para se concluir que a Igreja Católica considera, por exemplo, a consagração ilícita de um bispo sem mandato pontificial um delito mais grave que os crimes de estupro, genocídio, infanticídio, homicídio, latrocínio, escravidão e tortura. São realmente critérios muito justos...

Quem é excomungado fica proibido de receber sacramentos como batismo, comunhão, crisma e casamento (realmente desesperador).

A imprensa italiana publicou, nesta sexta, reportagens afirmando que o Vaticano apóia a decisão do arcebispo de Olinda e Recife, dom José Cardoso Sobrinho, de excomungar os envolvidos na interrupção da gravidez de uma menina de 9 anos.

O presidente da Comissão Pontifícia para a América Latina, o cardeal Giovanni Battista Re, considera "justa" a excomunhão dos médicos que praticaram legalmente um aborto de uma menina de 9 anos grávida de gêmeos após ter sido violentada pelo padrasto.

Palmas para eles. Essa é a justiça da igreja católica. O Vaticano apóia a decisão do arcebispo. E o cardeal considera justa a excomunhão. Então por favor não me falem que essa posição da igreja católica se trata de uma exceção, quando na verdade é regra, a excomunhão é destinada a todos que realizarem o aborto, seja sob quaisquer circunstâncias, incluindo o risco de morte para a mulher e o estupro.

Segundo o arcebispo: “A lei de Deus está acima de qualquer lei humana. Então, quando uma lei humana, quer dizer, uma lei promulgada pelos legisladores humanos, é contrária à lei de Deus, essa lei humana não tem nenhum valor”

É melhor avisar o pessoal para defender a escravidão (Levítico 25, 44-46), a possibilidade de vender sua filha como escrava sexual (Êxodo, 7-11), surra de vara nos filhos desobedientes (Provérbios 13, 24; 20, 30; e 23, 13-14), a morte aos filhos rebeldes (Êxodo 21, 15; Levítico 20,9; Deuteronômio 21, 18-21, Marcos 7, 9-13; Mateus 15, 4-7), o apedrejamento de pessoas até a morte por heresia, adultério, homossexualismo, por trabalhar no sábado, adorar imagens e praticar "feitiçaria".

É a vontade de Deus, as leis humanas não tem nenhum valor quando contrárias à vontade de Deus. Esqueçamos os direitos fundamentais, os direitos humanos, a repulsa à escravidão, ao estupro, à tortura, ao racismo, ao genocídio... e fiquemos com as leis de Deus... voltemos à escravidão! Vamos surrar nossos filhos em caso de desobediência e depois matá-los! Morte aos hereges! Morte aos adúlteros! Morte aos homossexuais! Morte aos trabalhadores de sábado! Morte aos adoradores de imagens! Morte! Morte! Morte!

O teólogo e ex-professor da PUC de São Paulo João Batistiole comentou a excomunhão dos envolvidos no aborto legal. “Acho que é uma posição dura, difícil de entender, uma posição institucional. Acho que a igreja perde um pouco da credibilidade perante seus fieis”, avalia.

Qual credibilidade?
- 94% dos católicos brasileiros são a favor do uso da camisinha.
- 74% dos católicos brasileiros são a favor do divórcio.
- 72% dos católicos brasileiros são a favor do aborto de feto anencefálico.
- 56% dos católicos brasileiros são a favor do segundo casamento.
- 56% dos católicos brasileiros são a favor da eutanásia.
- 46% dos católicos brasileiros são a favor da legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo.
- 43% dos católicos brasileiros são a favor da adoção de crianças por casais homossexuais.
- 16% dos católicos brasileiros acham que deve haver mais casos em que o aborto fosse permitido.
- 10% dos católicos brasileiros acham que o aborto deve deixar de ser crime em qualquer caso.

Esses dados mostram a falta de credibilidade da Igreja Católica no Brasil, considerando que apenas 10% dos católicos brasileiros, na teoria, concordaram com a decisão da igreja sobre esse caso.

"É um caso penoso, mas o verdadeiro problema é que os dois gêmeos concebidos eram pessoas inocentes, tinham direito de viver", afirmou o cardeal em declarações publicadas neste sábado pelo jornal italiano "La Stampa", apoiando a atitude do arcebispo de Olinda e Recife, dom José Cardoso Sobrinho.

"Os bispos predicam justamente o mistério da vida, enquanto o aborto não é uma solução, é um atalho", disse.

Quanta moral! Quanta justiça! Os gêmeos concebidos tinham o direito de "viver"... e a menina... deixe morrer... se há uma chance de salvar 2 "vidas" por um por que não?

A interrupção voluntária da gravidez "sempre representa o assassinato de uma vida inocente e, para o código do direito canônico, quem pratica ou colabora diretamente com o aborto cai na excomunhão", acrescentou.

Ditadura celeste. Rígida. Literal. Direta. Imutável. Imponderável. Inquestionável. Indiscutível. Indeclinável. Inesclusável. Imperiosa. Indiferente. Injusta.

A missão da Igreja Católica "é a defesa da vida e, por isso, cada um de nós deve ter um comportamento de grande respeito a esta gravíssima dor", diz Grieco, em declarações ao mesmo jornal italiano.

Onde está o grande respeito à gravíssima dor que sofreria a menina na hora do parto, o que poderia levá-la à morte? A defesa de qual vida o igreja católica se refere? À sua própria?

O médico Rivaldo Albuquerque, que participou do atendimento, já havia sido excomungado antes. Ele entrou em choque com a Igreja Católica desde que participou da criação de um serviço de atenção às mulheres violentadas, que faz o aborto nos casos previstos por lei. Católico praticante, ele disse que não vai deixar de assistir à missa.

Ainda não entendo como é possível alguém continuar seguindo uma religião com a qual não concorda em alguns pontos. Quando se fala de política, eu posso estar em um partido e não concordar com algumas atitudes do mesmo. Mas quando se fala em religião, não se pode simplesmente discordar com algumas atitudes da mesma - por que concordar com o dogma da criação do universo por deus e, ao mesmo tempo, ser contra o genocídio (ordenado tantas vezes pelo deus bíblico)? Qual o sentido disso? Por que simplesmente não pensar sobre o assunto?

Ministro da Saúde, José Gomes Temporão, diz que ficou impactado com o caso:

"Eu acho que a posição da Igreja (Católica) é extrema, radical, inadequada, me parece um contrassenso diante do que aconteceu”, disse o ministro em Brasília.

O presidente Lula lamentou o "comportamento conservador" do bispo e afirmou que: "Nesse caso, a medicina está mais correta que a Igreja".

Recentemente, a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) desautorizou a iniciativa do arcebispo de Recife e Olinda de anunciar a excomunhão da mãe da menina de 9 anos submetida a um aborto na semana passada e da equipe médica que participou da interrupção da gravidez, alegando que a mãe agiu sob pressão para salvar a vida da filha. e que não há elementos para dizer qual médico está excomungado e qual não está. "Depende do grau de consciência de cada um", disse ainda d. Dimas. Segundo o secretário-geral, estão excomungados somente os profissionais "conscientes e contumazes" na prática do aborto.

Durante entrevista coletiva, foi distribuído um documento sobre excomunhão, assinado pelo assessor canônico da CNBB, padre Enrique Pérez Pujol, que destaca o fato de que a punição não deve ser aplicada em meio a uma polêmica.

A CNBB só alega isso só para não perder mais a defasada credibilidade com o povo brasileiro. Já foi mostrado aqui que o Vaticano apóia a decisão, e a CNBB segue as ordens do Vaticano, portanto, não há o que se discutir.

A frase "A punição não deve ser aplicada em meio a uma polêmica" implica em 2 conclusões:

1ª - A punição deve ser aplicada. 2ª - A igreja católica está tentando fugir da polêmica, para não perder mais credibilidade.

Equipe médica excomungada e diretora do hospital diz que "teria feito tudo novamente".

Segundo contou a mãe da menina ao médico, a garota tinha menstruado há 4 meses e não mais.

A menina tem 1,33m, pesa 36kg e mantinha uma gravidez de alto risco.

A menina recebeu alta no dia 6 de março e passa bem.

Acho que este pensamento de James Randi, um dos maiores mágicos do mundo atual (se não o maior): "O papa é um dinossauro medieval perigoso e intolerante" e outro de Nietzsche: "As convicções são inimigas mais perigosas da verdade do que as mentiras" resumem o caso.
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Bibliografia


¹ Bíblia Sagrada, Editora SBB.

² Livro: "Carta a uma nação cristã", do filósofo Sam Harris.
³ Revista Super Interessante, reportagem da capa de novembro de 2005.